A Peninsula

Sunday, April 25, 2010

O ANIVERSÁRIO DE MENTIRINHA DO MEU PAI

Como muitos filhos de imigrantes das primeiras décadas do século passado, meu pai foi registrado depois de seu nascimento. Exatamente 1 ano e meio após.
Meus avós paternos vieram da Polônia antes da Segunda Guerra, fugindo assim do extermínio nazista. Vô Henrique Goldberg (nascido Hirsch Gilbert) chegou primeiro e mandou buscar a Vó Raquel (originalmente Rifka), como era costume à época.
Sem falar uma palavra em português, instalaram-se no Rio Grande do Sul, em Pelotas. Depois, mudaram para Rio Grande, 56km mais ao Sul.
Alfaiate e costureira, construíram sua vida - e prepararam a dos filhos Abrahão, Isaac, Cecília, Rosa e Jaime - costurando.
Até entenderem as leis e a língua brasileiras, passou-se um bom tempo. Meu pai e seu irmão mais velho são dessa fase. Nascido em Pelotas em 25 de outubro, apenas num 25 de abril Dr. Isaac foi registrado.
Nossa família sempre gostou de aniversários, o que não implica necessariamente em festa. Talvez a possibilidade de não ter sobrevivido, como a maioria da família que não escapou às câmaras de gás, faça mais um ano vivido tão importante.
Lembro das nossas festas de aniversário, minhas e dos meus irmãos. Até minha boneca Wandeca ganhou festa de 1 aninho, com bolo igual ao meu, feito na mesma confeiteira. Da festa que fiz para meu pai quando mocinha da sociedade da nossa pequena cidade (porte médio para o RS, como gosto de dizer), com garçom em casa e todos os luxos da época. Minha festa de 15 anos num clube, primeira vez que vi um DJ.
Em abril eu, meus irmãos e minha mãe - que não gosta muito de celebrar o próprio, mas esse ano não nos escapa - nos lembramos que é aniversário do pai. Sempre o parabenizamos. E ele sempre se faz de surpreso!

Os presentes são outra marca dessa celebração entre nós. Quando criança, meu pai recebia os convidados na porta. Quem viesse de mãos vazias não entrava. Meus irmãos tiveram lições com os seus, arquitetados por meu pai e com a minha participação. A guitarra do Gui, o som do Dani.
O texto abaixo foi inspirado em minha experiência como tia.

JAVALI DE ANIVERSÁRIO

- Eu quero comer javali.
Roberto não parava de pensar na resposta que ouvira de seu filho, quando perguntou o que ele queria de aniversário.
- Javali, javali. De onde o Pedrinho tirou essa idéia?
Roberto passou dois dias quebrando a cabeça e então, concluiu: ah, só pode ser isso. Ele andou vendo Asterix. Esse menino tem o mesmo gosto do pai, pensou orgulhoso.
Convocou a família para organizar uma grande festa gaulesa para o menino. Do enfeite do bolo às bandeirolas, tudo teria inspiração em Asterix e sua turma.

Chegou o dia. Roberto parecia mais ansioso que o filho.
- Será que ele vai gostar?
Pedrinho voltou de um passeio organizado por seu pai para que estivesse fora, enquanto arrumavam a casa. Olhou os enfeites, acho divertido, abriu os presentes, brincou com os colegas, apagou a velinha em formato de menir.
Observava seu pai brincando com seus amigos e decidiu lhe dar mais um pouco de tempo.
Olhou o relógio, já era hora de alguém tomar uma atitude. Puxou o pai para o canto e falou:
- Pai, você já brincou o suficiente? É que tá ficando tarde e eu ainda tô esperando o meu presente.
Sem entender direito, Roberto quis levar Pedrinha para a festa, ía colocar "Asterix contra os Romanos" no vídeo, mas o menino insistiu:
- Pai, seu aniversário tá perto. Eu faço uma festa prá você e chamo os meus amigos. Eu também acho os seus muito chatos, não dá prá brincar com eles. Mas quando a gente vai sair prá comer javali?

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